HABEMUS PAPAM (2012), como um bom filme italiano, já
traz implícito aquele tom jocoso e alegre usado para criticar as coisas como se tudo fosse risível. Sendo de Nanni
Moretti, então, já se pode imaginar o tamanho da caricatura!
Não, não se trata de um filme religioso,
Moretti é ateu e traz como contraponto a peça teatral A Gaivota, de Anton
Tchékhov: peça que se pretendia comédia e virou drama através do personagem
Treplev, um dramaturgo que fracassa ao tentar trazer seu trabalho reflexivo aos
moralistas e conservadores dramaturgos russos.
Em Habemus Papam,
Moretti nos apresenta a um conclave do Vaticano para eleger o novo papa após
mostrar imagens de aqrquivo da morte de João Paulo II. Mesmo havendo favoritos
de todas as partes do mundo, os cardeais, não conseguindo chegar a um consenso,
elegem Melville, o personagem do delicioso Michel Picolli, só porque é o mais
simpático e quietinho, entre os presentes.
E ai começa a
sátira, pois o novo papa entra em profunda crise diante de sua eleição; sequer
chega a ser apresentado na sacada, ao público e mídia do mundo inteiro que
espera pelo nome do novo papa, porque quando foi chamado a isso, lá dentro,
antes de vir a público, teve uma crise de histeria, chorando e se recusando a
aparecer.
O que se desenrola é muito bonitinho, pois o novo
papa queria mesmo é ser ator, e, a despeito dos esforços do Vaticano em
estabilizá-lo emocionalmente, o velho foge à paisana em perambulação anônima
pelas ruas de Roma, enquanto todos ficam presos no Vaticanos, para não anunciar
a ninguém o que se esta a passar.
Antes da fuga do
velho papa, o Vaticano, mesmo não admitindo a existência do inconsciente,
porque não poderia coabitar com a alma (seriam 2 noções antagônicas), contrata
um psicanalista vivido pelo próprio Moretti, para tentar controlar a crise.
Imperdível a cena em que o psicanalista vai fazer a primeira sessão com o papa:
todos os cardeais ao redor, não os deixarão a sós, desconfiados! E ainda não se
pode perguntar ao papa nem sobre sua mãe, nem sobre sua infância, nem sobre
seus sonhos; é hilário!
Quando o velho escapa do Vaticano, o psicanalista,
preso com os cardeais até a resolução dos problemas, acaba realizando com eles
uma espécie de terapia de grupo, através da organização de um jogo de vôlei,
que expressa uma crítica inteligente de Moretti à questão geopolítica que já
fora exposta, durante a eleição, no conclave.
Em meio a tudo isso, o papa acaba se hospedando no
mesmo hotel que uma trupe teatral, e se mistura justamente com a interpretação
de A Gaivota, de Tchékhov: se nos mostra, então, o papa que queria ser ator e
não se deu conta do grande palco que é o Vaticano; a grande ausência do divino
no cargo que se pretende o representante de Deus na terra; o quanto a igreja
católica é fechada em si mesmo, a despeito da grande bondade e aparente
ingenuidade de seus cardeais, que, no filme, são bem pouco inteligentes.
Enfim, mais do que uma simples crítica à igreja
católica, Moretti nos leva a olhar os homens em seus anseios humanos, não
importa qual manto de "santidade" estejam usando.