Não entendo por que as pessoas, e
a crítica em geral, se referem a Séptmo
tão somente como um filme de suspense.
Não é!
Aquele apartamento no sétimo
andar de um prédio em Buenos Aires, abriga muito mais histórias e mágoas que
dizem com relacionamento e relações familiares, do que possa supor qualquer vã
história de suspense.
Se você começar a assistir o
filme com a perspectiva única de ver um filme de suspense, chegará um
determinado momento em que se perguntará “que diabos de porcaria de filme de
suspense é esse?”
Isto porque dentro da história do
sumiço dos filhos do casal recém divorciado, Sebastián, interpretado pelo tudo de bom Ricardo Darín, e Delia -
a atriz espanhola Belén Rueda, de O Orfanato, há uma porção de “furos”, se
teimarmos em ver o filme unicamente sob a ótica do filme de suspense.
Há um suspense, é certo – o pai
desce pelo elevador e os filhos, Luca
(Abel Dolz Doval) e Luna (Charo Dolz Doval) pela
escada, numa brincadeira que se repete há tempos e sobre a qual a mãe, ao
deixar as crianças com o pai, advertira-o a não repetir, e os filhos
desaparecem nesse ínterim.
A lógica diz que eles têm de estar
no prédio, pois o pai, vindo do sétimo andar pelo elevador, ainda que o
elevador, antigo, tivesse parado por um breve instante, como a indicar uma
pequena falha, é certo que, mesmo assim, as crianças não chegariam antes dele
ao térreo pelas escadas.
Além disso, o porteiro demonstra
convicção de que esteve por ali o tempo todo e que por ali as crianças não
passaram.
Darín, de
rosto barbeado e terno, empresta o corpo a um advogado que deveria sair para um
julgamento onde defende alguns clientes que sua ex-esposa, antes de sair para o
trabalho, chama de pilantras e delinquentes.
Ele deveria estar na audiência de
julgamento, mas seus filhos desaparecem. A cada instante alguém ligando de seu
trabalho para lembra-lo de que se não aparecer estará frito.
Sua irmã, Gabriele, também telefona se queixando do ex-marido que a está
ameaçando, num caso que parece ser um caso complicado de família em que Sebastian também atuou.
A mãe das crianças, antes de sair
para o trabalho, pede que Sebastian assine
os papéis autorizando-a a voltar para a Espanha com os filhos do casal, pois
quer cuidar de seu pai que está doente.
Sebastian não quer
se afastar dos filhos e lembra que o sogro tem dinheiro suficiente para
contratar uma enfermeira. Delia lembra
ao pai de seus filhos o quanto o seu próprio pai o ajudara quando se conheceram
em Madri e o quanto era responsável pelo sucesso profissional e financeiro do
ex- marido. Argumenta que ele poderá visitar os filhos na Espanha sempre que
quiser.
Ainda neste momento do filme, nos
vem a informação de que ambos estão divorciados porque Sebastian traiu a mulher durante um ano com a melhor amiga dela.
Depois que os filhos somem, o
filme passa a transitar numa dimensão mais etérea...
Ou seja, a forma como ele trata
de procurar as crianças, como pede ajuda ao síndico do prédio, um policial com
o qual tinha brigado numa reunião de condomínio, como se relaciona com a
ex-esposa, após a mulher retornar do trabalho, desesperada com a notícia do
sumiço dos filhos, o modo como o celular fica guardado no bolso do paletó e com
a bateria acabando, quando se está esperando o telefonema de supostos
sequestradores...
Tudo, enfim, que diria com um
filme policial e as técnicas de suspense, passa a ocupar uma dimensão mais anuviada,
irreal e, neste particular, Patxi
Amezcua, o um diretor catalão de Sétimo, faz com maestria uma transposição
do que deveria ser um filme de suspense, para os aspectos mais subjetivos que,
estes sim, são o verdadeiro plano central do filme.
A maior surpresa de Séptimo é que você só se dá conta disto
quando o filme acaba. Não posso dizer mais porque
alguns leitores do blog já brigaram feio comigo por eu contar o final dos
filmes.
Eu particularmente não vejo mal
algum em assistir um filme sabendo o final, pois o mesmo se dá quando a gente
lê um livro e vai pro cinema ver a versão animada.
Mesmo assim, em respeito aos
leitores do blog, me reservo a informar apenas que, em Séptimo os personagens centrais cometeram faltas graves.
Ora, trair uma mulher com sua
melhor amiga durante um ano, até ser descoberto, é, sem dúvida, uma grande canalhice
e falha grave de caráter.
A questão é: quando se trata de
vingança, até onde se pode chegar quando se é a mãe dos filhos do homem que a
feriu?
Ficam as questões, para posterior
discussão: os pecados do homem, sempre serão perdoados, ao tempo em que os
delitos femininos serão tratados como crimes brutais? Nas questões envolvendo
direitos de família, é difícil separar o homem – canalha, covarde, traidor – do
grande e bondoso pai que é? A simbiose entre os papéis de mulher – traída,
enganada, ludibriada, e mãe – zelosa, amorosa – poderá algum dia ser quebrada?
Até que ponto os filhos menores são vulneráveis aos sentimentos derivados das questões
sexuais de seus pais?
Sim, aquele apartamento no sétimo
andar de um prédio em Buenos Aires, abriga muito mais histórias e mágoas que
dizem com relacionamento e relações familiares, do que possa supor qualquer vã
história de suspense.