Lars Von Trier é um signo psicanalítico ambulante e, como tudo
nele tem um significado, eu me atreveria a dizer que não foi por acaso a
escolha de Kiefer Sutherland, o corajoso Jack Bauer de 24 Horas, para viver o
frágil e covarde personagem masculino neste filme (pensando bem, todos os
filmes de Lars, têm um homem nessa posição).
Mas, sobre o filme, o êxtase começa com as cenas já, dos primeiros 10 minutos, orquestradas pela íntegra do prólogo da ópera Tristão e Isolda, de Richard Wagner. Vários quadros em câmera super lenta onde somos apresentados às irmãs Justine (Kirsten Dunst), a depressiva que não consegue encontrar alegria nem no dia de seu casamento, e Claire (Charlotte Gainsbourg), a obcecada mãe de um garotinho e dependente esposa do milionário John, apaixonado por astronomia, cujo papel secundário na trama é interpretado por Kiefer Sutherland.
Ao final do prólogo de Wagner, um cavalo cai em silêncio (isso mesmo! Um cavalo!) anunciando o fim do mundo.
Desenrola-se o enredo com a cerimonia de casamento de Justine, no castelo de John (que parece ser o mesmo cenário do último concerto de Herbert Von Karajan: http://www.youtube.com/watch?v=WPUT-LDo_nY).
Justine não está dando a mínima para o ritual minuciosamente planejado pela irmã Claire e fartamente patrocinado pelo cunhado John - Justine chega a se oferecer para colocar o sobrinho para dormir, somente para se afastar da festa e tirar uma soneca, depois, tomar um banho de banheira, entre outras coisas, que incluem até transar com o estagiário de publicidade que fora colocado em seu encalço pelo dono da agência, que dera de presente de casamento a Justine a promoção para o cargo de diretora.
Justine não liga a mínima para os rituais e cerimonias; para ela nada faz sentido e a assusta a obrigação que lhe impõem: ser feliz!
Seu casamento termina na mesma noite da cerimônia e começa a segunda parte do filme, onde se foca na passagem do planeta Melancholia muito próximo da terra.
Na segunda parte do filme, a certa altura, invertem-se os papéis: a depressiva Justine encontra uma incrível segurança na possibilidade do mundo se acabar e a controladora Claire mergulha no pânico, nervosismo e insegurança. Este é o grande trunfo do enredo e é difícil não querer premiar as duas como atrizes principais!
A personagem Justine é, declaradamente, o alterego de Lars Von Trier - teria sido vivida por Penelope Cruz, se ela não tivesse preferido filmar Piratas do caribe IV (bem feito pra ela!); o filme, aliás, surgiu de uma conversa entre Lars Von Trier e Penélope Cruz.
Lars declarou que sua moralidade foi influenciada pelo romantismo alemão, o que o colocou num posto especial da lista de marginalidade hollywoodiana.
A cena final nos coloca num estado tal, de arrebatamento e êxtase, nos integrando ao filme, fazendo com que dele passemos a fazer parte, tanto que... Não sei, mas acho que enquanto eu viver jamais conseguirei me desligar desse momento! O fim do mundo!
Aliás, tenho cá pra mim que meu amado Lars Von Trier me cochichou aos ouvidos, bem baixinho, e romanticamente: "Tânia, ouça, o fim do mundo é não encontrar alegria em viver... Ouça, o fim do mundo é a covardia masculina... Ouça..."
Listen: Open your ears, open your mind, open your heart...
Ophelia de John Everett Millais - imagem recorrente nos filmes de Lars e filmada ipsis literis, em Melancholia. |
Um comentário:
Sem dúvida alguma Lars Von Trier é meu diretor predileto. Fã desde que assisti pela primeira vez Dançando no Escuro, Melancolia só veio reforçar a tietagem descarada. Cenas muito bem construídas e diálogos com segundas ou terceiras intenções, além do pessimismo real e não fútil que cada personagem passa. Ele é brilhante!!!
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